Casos de agressões e abusos sexuais contra crianças aumentaram durante a pandemia. Conselhos tutelares de todas as regiões da cidade de São Paulo registraram crescimento de denúncias.
Dados do Conselho Tutelar do Rio Pequeno e Raposo Tavares, na Zona Oeste da capital paulista, levantados a pedido do portal R7, mostraram que, em fevereiro de 2021, o número de denúncias foi 12 vezes maior do que o registrado no mesmo período do passado.
Segundo o portal, nessas regiões houve um aumento de 1.100% em casos de maus-tratos e violência sexual contra menores de idade.
O conselheiro tutelar do Rio Pequeno, Gledson Deziatto, destacou que o isolamento social deixou o agressor dentro de casa.
– O pai, que tinha um histórico de violência, de ser uma pessoa agressiva, trabalhava fora. Nos últimos meses, o agente violador fica mais em casa e, com isso, aumentam os casos de agressões.
Fora isso, a perda de empregos, provocada pela crise econômica, também pode ter contribuído para que pais descontem suas insatisfações nas crianças.
– Nessas situações, muitos aumentaram o consumo de álcool e passaram a descontar as insatisfações e frustrações nos filhos. Com isso, passamos a atender mais casos de espancamento – disse Gledson.
Ele relatou ainda casos de mães que entregaram os próprios filhos aos conselhos.
O conselho tutelar que atende a região de Santo Amaro também registrou aumento de casos de violência contra menores. A conselheira Rudneia Alves Arantes lembrou que, antes da pandemia, as escolas tinham papel fundamental na identificação dos casos.
– Os professores percebiam qualquer anormalidade e já nos comunicavam – falou.
Para dar conta da alta procura, os conselhos tutelares alegam que precisam de uma rede de serviços estruturada.
– Eles devem fazer as primeiras verificações sobre as denúncias que recebem, tomando providências, por meio de medidas de proteção, com acolhimento da criança, se necessário, ou colocando a vítima sob a proteção de familiares como avós e tios – disse Alves.
Eles acionam também serviços públicos de centros de apoio psicossociais, programas de apoio e orientação às famílias, por meio do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), responsável pela prevenção de situações de vulnerabilidade social e risco nos territórios, e do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), responsável pelas consequências e acompanhamento das famílias e indivíduos que já tiveram seus direitos violados.
A alta demanda também tem afetado a saúde mental dos conselheiros. A Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania informou por meio de nota que, desde janeiro de 2019, fornece toda a infraestrutura para o funcionamento adequado dos 52 Conselhos Tutelares na capital.
A secretaria destacou que, “desde 2019, realiza cursos e capacitações voltados aos conselheiros visando à utilização do SIPIA (Sistema de Informação para Infância e Adolescência), mantido pelo governo federal para registro em uma base oficial de dados, garantindo uma análise técnica adequada de forma a assegurar o suporte necessário às demandas de atendimento voltados a criança e adolescente. Mas hoje apenas dois dos 52 Conselhos Tutelares têm utilizado o Sistema. Somente 35 conselheiros de 260 fizeram o cadastro.”
“ESTAMOS ENFRENTANDO UM CICLONE”
A conselheira suplente do Sapopemba, Joelma Damasceno, também falou sobre o aumento das agressões contra crianças.
– Estamos enfrentando um ciclone por conta da pandemia. Tivemos um índice elevadíssimo de agressões contra crianças – falou.
A região em que ela atua tem habitantes em situação de extrema vulnerabilidade.
– Essa característica por si só já é agravante porque faz as pessoas perderem as estribeiras muito rápido. Pais, mães, avós, sobrinhos estão todos alocados no mesmo espaço – pontuou.
De acordo com Joelma, só no dia 25 de janeiro o conselho tutelar recebeu cinco denúncias de abuso sexual. Em três destas denúncias, a equipe teve que ir até a delegacia porque o abusador tinha sido preso em flagrante.
– As denúncias dobraram; são dois celulares de plantão tocando constantemente – contou.